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"Estas & outras Cumplicidades"

"Estas & outras Cumplicidades"

Línfomania - Se a cabeça, não tem juízo, o corpo é que paga

30.09.24, cumplicedotempo

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Seguimos então para mais um ciclo, neste caso até serão dois, vamos juntar o terceiro e o quarto, seis semanas em que mais uma vez, nem me posso queixar muito das sensações e sintomas, ao longo destas semanas a inevitável secura de boca e garganta nos primeiros dez dias de cada ciclo e felizmente, repito felizmente nada de especial.

O que vamos percebendo e aprendendo ao longo deste processo em que o tempo passa muito devagar é que o nosso corpo sofre uma enorme transformação, e que é ele, que de hoje em diante dita as regras, e por isso é muitíssimo importante lhe dar ouvidos, ou como diz o titulo de hoje “se a cabeça não tem juízo, o corpo é que paga”, e acreditem poupa-lo ao máximo é a nossa maior prioridade, o processo é longo e ele bem vai precisar de ser poupado.

Considero me uma pessoa de sorte, e ai está falo no meu caso em particular, nunca ter sofrido com enjoos, náuseas ou mesmo falta de apetite, pelo contrario toda esta aventura fez com que eu ganhasse novos e bons hábitos nesse aspeto, e só fiquei a ganhar com isso, a boca seca era um atrito para certo tipo de comidas, mas tudo se adapta e se resolve consoante as necessidades, bastou um pouco de criatividade na criação das ementas e evitar certo tipo de comidas ou confeciona-las com acompanhamentos que as tornassem menos penosas de se ingerir.

Um sintoma que ao longo de toda esta aventura não nos vais deixar é o desconforto e o cansaço, não que seja um cansaço incapacitante que nos obrigue a nada fazer, mas  irá nos limitar bastante, e a incerteza do estado que estamos ou podemos estar nem que seja daqui a uma hora, irá fazer que não se possa planear demasiado as coisas, até uma simples ida a pastelaria a 50 metros de casa como disse no post anterior pode ser uma grande desafio, nos dias que sentimos que o corpo aguenta mais um pouco, deve se aproveitar para o por a mexer, para não deixar que ele entre numa qualquer letargia que pode ser negativa no futuro

E eu assim fui fazendo, sabendo de antemão que para lá da vontade, o corpo é que iria me dizer os limites do que poderia fazer, por esta altura muitas idas a padaria não passaram de intenção aos primeiros passos da manhã, como em outros dias, já conseguia dar as minhas voltas pelo parque, ou mesmo sair de casa sentar no primeiro banco de jardim e o corpo dizer “oh cúmplice onde pensas que vais moço”, e la voltava eu para casa.

E eu também cometi alguns erros que serviram de lição desde inicio, e cito alguns como a parvoíce de meter uma bebida energética a boca pensando que me iria aliviar o desconforto da boca seca, aquela coisa secou me a boca de tal maneira… e acreditem não ganhei asas com a coisa, devo ter bebido uns cinco litros de agua para a coisa a voltar ao normal, a partir dai água e sumos naturais e não te armes em parvo, outro foi achar que um amigo vindo me buscar a casa, não haveria qualquer problema e poderia perfeitamente ir visitar os amigos ao café dos costume (sarilhos snack, passo a publicidade que ele merece) , o resultado foi um total mau estar a tarde toda, e não por que alguns amigos até são uns chatos e outros melgas, mas porque o senhor meu corpo, diz que uma coisa é estar em casa, onde podemos, sentar, deitar na cama ou no chão e encontrarmos o conforto que precisamos, outra é estar num café, e isto foi, feito nos primeiros dias do ciclo, serviu de lição para não teres a mania que és herói da banda desenhada cúmplice , a partir dai saídas e visitas só nas terceiras semanas e quase sempre aproveitando as idas ao hospital para consultas.

E assim nos vamos adaptando e aprendendo, de resto como disse dois ciclos até bem tranquilos (por não ter aparecido novas complicações, o resto é a tranquilidade que devemos ter apesar de tudo o que podemos sentir e passar), muita boca seca, o cansaço e no terceiro ciclo já consegui controlar as dores das injeções, em ambos os fins de ciclo, analises ótimas e corpo bem recuperado, na ultima consulta também fiquei a saber que só me faltariam dois ciclos para terminar a quimioterapia, vamos lá cúmplice são mais 6 semanas, mais de metade já passou, venham eles.

Cenas dos próximos capítulos: “Que eu era doce sabia, agora a este nível é que não”

Nota: uma coisa que aprendi ao longo desta aventura, valoriza as cumplicidades e o tempo, o resto será sempre o resto.

Hoje foi assim - Hoje apetece me fazer anos

12.09.24, cumplicedotempo

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Hoje apetece-me fazer anos, pois é, uma coisa que raramente me apetece fazer, mesmo que só se faça uma vez por ano, que posso dizer nunca liguei patavina a isso de anos se fazer, é chato quando as pessoas insistem em dizer-te e lembrar que estas a ficar velho, obviamente estou a brincar, mas pronto, de parabéns, estamos todos os dias e isso não é num qualquer sentido literário, é porque é mesmo assim.

Mas hoje apetece-me fazer anos, e não é por causa de ter acumulado uma meia centena de anos e uns trocos, uns quantos cabelos brancos armados em parvos ou mesmo uns neurónios a ficar no ponto crocante da coisa.

Apetece-me, mais do que tudo festejar este último ano que passou, talvez o primeiro ano da minha existência que me devo lembrar dos seus 365 dias, e de algumas noites também, um ano que me permitiu desafiar-me a mim mesmo, e se na minha cabeça existia muita teoria, um ano que me permitiu e obrigou entre aspas a passar tudo para a prática. Porque ah e tal isto é tudo muito giro dito ou escrito, mas na prática minha gente, tem muito que se lhe diga.

Um ano em que percebi que o tempo é aquilo que quisermos fazer dele, passe ele rápido, passe ele muito devagar, um ano em que entendi que podemos nem ter tudo o que queremos, mas na maioria das vezes temos mais do que aquilo que precisamos, um ano que percebi o significado de a vida te por a prova, te desafiar e te obrigar a andar da perna, mesmo que não tenhas vontade para a aturar.

Poderia ter sido de outra forma? Poderia sim, mas no meu caso a vida decidiu aparvalhar e a mim nada mais restou, do que me deixar levar nessa parvoíce que decidiu fazer parte da minha vida.

Um ano de dias intermináveis, de esperas, de dúvidas, de incertezas, de acordar de manhã sem fazer a mínima ideia de como seria a tarde, em que a volatilidade entre o bem e o estar menos bem, era uma constante.

Em que uma simples ida ao café a 50 metros de casa, requeria um estudo completo de engenharia física e biológica, com duas paragens pelo meio, ou até descer as escadas e ter que voltar para casa, porque afinal ainda há 5 minutos atrás parecia que dava, mas agora não dá mesmo.

Um testar de paciência que nunca imaginei ter, um total abrandar em literalmente tudo o que é o nosso dia a dia.

Um dia a dia sem planos e repleto de tempo livre, um reinventar de hábitos e costumes, uma introspecção que jamais me passaria pela cabeça fazer, o resto é o que pelo “linfomania” que ainda vai no mês de Março se vai contando, e mesmo que isto seja uma espécie de spoiler que a data assim o merece.

Hoje 12 de Setembro de 2024 apetece-me fazer anos por que este ano foi do caraças e neste ano decidi que quem tem que aparvalhar sou eu e a minha maneira, e não uma doença qualquer que a vida tinha reservado para mim.

Hoje foi assim, apeteceu me fazer anos,já ontem me apeteceu e pelo andar da carruagem, amanhã e depois não se safam, para o ano já não prometo que me apeteça.

Línfomania - A travessia no deserto segundo a minha boca e os seus discípulos

11.09.24, cumplicedotempo

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Vamos lá então falar sobre este segundo ciclo, passado o dia de tratamento que como já disse antes, não me traz quaisquer efeitos indesejados, sendo até um dia bastante normal, os seguintes da primeira semana são os famosos dias da toma em doses industriais de comprimidos (considero dose industrial, tudo o que é acima de meia dúzia), e neste caso são mais de uma dezena diariamente até pelo menos a sexta feira da primeira semana.

E obviamente estamos a falar de comprimidos bastante pesados para o organismo, isso implica uma total mudança de hábitos, quer seja na ingestão de líquidos ou na alimentação, uma má alimentação pode complicar e muito todo este processo, um dos conselhos que mais vez ouvi ao longo desta aventura por parte de técnicos e enfermeiros “mais do que comer muito numa ou noutra refeição, importante é comer varias vezes ao longo do dia”, isso ajuda bastante; também a ingestão de líquidos é importantíssima e ajuda nos a prevenir muitos efeitos indesejados, não esquecendo que os rins sofrem muito ao longo de todo este processo, por isso a sua importância , entre muitas outras coisas.

E por falar em líquidos, vamos la começar a minha famosa travessia no deserto, pois de todos efeitos indesejados que já citei em outros posts, neste segundo ciclo, um em particular iria me afetar, a boca e garganta seca, e se à primeira vista não parece nada de muito anormal ou grave, se comparado com outros efeitos que até agora não deram sinais. Vai se tornar muito chato, porque uma coisa é aguentar a boca e garganta seca ao longo do dia bebendo muitos líquidos, outra é durante a noite, e isso pode se tornar muito incomodo, e eu vou ter essa experiência nesta primeira semana, a de acordar a meio da noite com boca e garganta completamente seca, o que é bastante agoniante.

E isso implica despertar, molhar a boca com água lentamente, para só depois ingerir água, “a minha primeira asneira foi tentar dar uma golada de água repentina, resultado, tudo para fora e uma sensação de asfixia”.

Mas pronto vai se aprendendo rápido, o problema disso tudo, é que com tantos despertares para, ou molhar a boca ou idas a casa de banho, o descanso é péssimo, mas tudo se adapta com o tempo, e afinal a nossa vida normal está em pausa, temos todo o tempo para nos dedicar ao descanso do corpo, e ele bem precisa.

Esse efeito logicamente leva a repensar também muita coisa que comemos e bebemos durante o dia, para mim a solução foi recorrer a muita água e sumos de fruta naturais, evitar bebidas com gás muito doces, sumos concentrados, tudo aquilo que nos pode deixar a boca demasiado doce, embora de quando em vez ter a sensação de doce pode ser reconfortante, devemos procurar as coisas que assim o sejam e nos satisfaçam, e nas alturas adequadas tirar delas proveito, estamos doentes mas não estamos proibidos de tudo, cabe-nos saber equilibrar as coisas e com o tempo perceber o que podemos ou não comer/beber.

Na alimentação dependendo das pessoas haverão coisas a evitar, no meu caso os picantes, não só pela secura da boca, mas também para não procurar problemas gástricos gratuitos, essa parte do corpo, é das que mais vai sofrer ao longo de todo este processo, e lá está cabe nos ter em conta aquilo que podemos controlar e assim evitar problemas adicionais.

De resto, restrições médicas passam no meu caso pela proibição de carnes cruas, frutas só descascadas e bem lavadas e se possível cozidas, tudo o que é enchidos é para esquecer entre outras coisas, se custa? ao início custa, aí as saudades que eu tenho de um bife mal passado, mas não pode ser, então vamos lá fazer as coisas bem feitas.

Neste segundo ciclo não senti a pseudo euforia da cortisona, e como no anterior cheguei ao fim da primeira semana bastante cansado, segunda semana injecções, mas desta vez com a medicação preventiva para as famosas dores, não acertei foi no horário da toma, deveria tomar bem mais cedo ao terceiro dia, e essa noite ainda levei com meio andarilho, mas pronto sabendo que o efeito era o desejado, andei essa noite feito parvo a rir me da minha figura a vaguear pelo corredor, que ali pela uma da manhã (pico da dor) nem sentado, nem deitado. No próximo ciclo já acertamos os horários por certo.

O Resto é a parte boa deste segundo ciclo, analises óptimas, corpo bem recuperado e alguns dias de descanso para o terceiro ciclo, e assim se vai passando o tempo que por estas alturas anda bem devagar, aceitando, aprendendo e adaptando.

Cenas do próximo capítulo: “Se a cabeça, não tem juízo, o corpo é que paga”

Nota: Eu sei que isto cada vez é maior o testamento, mas eu até tento resumir o máximo possível, por isso desculpem qualquer coisinha.