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"Estas & outras Cumplicidades"

"Estas & outras Cumplicidades"

Línfomania - O lounge, os anjinhos e a sorte que temos

17.08.24, cumplicedotempo

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Hora de enfrentar o segundo ciclo, o primeiro como disse foi até uma surpresa pela positiva, não fosse o problema das injecções, e teria sido bem tranquilo, mas não retirei disso qualquer conclusão precipitada, já o tinha referido em posts anteriores, neste tipo de tratamentos haverá sempre vários factores que podem mudar tudo repentinamente, agradecer por ter corrido bem, mas nunca embandeirar em arco como se costuma dizer.

O que me lembro perfeitamente deste segundo ciclo, foi a noite anterior ao tratamento no hospital, uma noite bastante chuvosa e sem saber bem porquê, uma noite muito mal dormida, todos os ingredientes para ir de trombas e cansado para a sessão de quimioterapia, levantei-me uma hora antes do previsto, não fosse dar-me o sono na hora de acordar, tempo suficiente para mudar o chip e seguir.

Para surpresa minha desta vez não iria fazer o tratamento na sala usual, repleta de cadeirões, mas sim, numa enfermaria com camas, o “lounge”, porque isso de fazer tratamento numa caminha é outra qualidade e proporciona outro espaço, que nos cadeirões não temos, óptimo para quem quer dormir uma soneca, coisa que nunca consegui fazer.

A enfermaria não tem mais do que oito camas, e por norma, quem para lá vai, ou tem tratamentos de longa duração, pouca mobilidade ou outras patologias que requer ficarem acamados, no meu caso foi mesmo por ser o espaço livre nesse dia.

E este post de hoje mais do que falar sobre tratamentos e afins, serve para falar, e em parte homenagear a senhora que vos irei apresentar a seguir, a qual, eu vou chamar a Senhora dos anjinhos.

A Senhora dos anjinhos é uma senhora franzina com idade para ser minha mãe, bastante debilitada, mas com um sorriso enorme na cara, deu logo a entender que era uma pessoa já bastante conhecida pela forma como era tratada e como ela tratava todos com um sorriso, vinha acompanhada de um senhor que à primeira vista pensei ser seu familiar, e deitou-se numa cama em frente a minha, onde ficaria a aguardar os resultados das suas análises, antes de qualquer tratamento.

E o que tinha de tão especial esta senhora?

Esta senhora era toda ela uma historia de vida, que desde logo me prendeu toda a atenção, e toda esta historia iria ser contada por ela, entre choros, risos, gargalhadas e nunca se queixando de fosse o que fosse, pelo contrario agradecendo por toda a sorte que ela dizia ter, e dai vem os anjinhos que de agora em diante iriam cair do céu como bênçãos que ela própria dizia ter, mas como era isso possível, se a primeira vista se percebia que esta senhora passava por um mau bocado, e nem interessa muito saber que cancro ou problema tinha, estava tudo perante os nossos olhos.

Pois o seu testemunho, a sua forma de pensar e lidar com as coisas, era , que apesar de todos os azares que o destino lhe tinha pregado, sentia-se feliz por ter boas pessoas em sua volta que a ajudavam e sentia se enormemente grata por isso.

Neste dia conheci a gratidão num pedaço de gente:

Devido aos seus braços magrinhos, não era fácil para a enfermeira encontrar veias para os procedimentos necessários, e a senhora de forma meia convulsa chorava como que se desculpando de algo que nem sequer tinha culpa, e de repente sorria agradecendo esse anjinho que tão pacientemente estava ali cuidar dela, e dizia obrigado mil e uma vez, como agradecia vezes sem conta, aquele senhor que estava ali esperando por ela, o seu anjinho, que nem da sua família era, mas que por ser boa alma se oferecia para a acompanhar aos tratamentos sem nada pedir em troca, e ela chorava e sorria agradecendo como se fosse a pessoa mais sortuda do mundo.

A sua história de vida, é a de uma pessoa sem qualquer posse, que sobrevive de uma pensão ridícula, que depende das ajudas que lhe dão, e por todas elas, ela agradece, e nunca ouvi dela, queixa de fosse o que fosse.

Os resultados das suas análises chegaram pouco depois, uma anemia, nada de muito anormal nestas doenças e com este tipo de tratamentos, mas é preciso se perceber o porquê, e por entre conversas de médica e enfermeiros (anjinhos quero eu dizer), ver o que poderia estar a falhar nas recomendações que lhe tinham sido feitas.

Conclusão, era a alimentação, e em jeito de desabafo a senhora lá explicou que recebia diariamente a comida de uma associação, e que devido a sua fraca dentição, muitas vezes não tinha como comer aquilo que lhe traziam, e como ela não queria se queixar aos anjinhos que lhe davam comida, nunca ousou lhes chamar a atenção …. E chorava e ria, e continuava a agradecer.

E fico me por aqui nos exemplos da senhora dos anjinhos, a parte boa dentro do possível, é que desde logo os anjinhos que ali estavam a tratar dela, fizeram questão de saber qual seria a associação em questão para entrar em contacto com eles, e arranjar uma solução na comida que lhe seria entregue, para que as refeições fossem o mais completas possível dentro das limitações que a senhora tinha, e muitas outras coisas seriam ali tratadas.

O resto foi boa conversa, choro risos e gargalhadas, até a hora de ir embora, incrível, mas nesse dia custou-me tanto vir embora, teria ficado ali o dia todo se fosse preciso, mas lá vim, e se hoje conto esta minha aventura, acreditem, muito se deve a senhora dos anjinhos, porque de uma forma ou de outra eu teria que contar esta história.

E lá vim todo sorridente a pensar para mim, oh cúmplice e tu vais te queixar de quê afinal? A sorte que temos, e muitas vezes nem percebemos.

Vim para casa completamente esgotado e bem cansado, e quando eu pensava que jantava e redondo na cama iria cair, a inspiração deu-me as voltas e foi nesse dia a noite que escrevi o “Vesti a felicidade” que podem encontrar no outro blog.

Como este mundo seria melhor com mais Senhoras dos anjinhos, Muito obrigado Dona A.

Cenas do próximos capítulos: “A travessia no deserto segundo a minha boca e os seus discípulos”

Línfomania - O andarilho, as gargalhadas e o espanto

06.08.24, cumplicedotempo

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Cá estamos então na segunda semana do primeiro ciclo, altura em que se toma as famosas injecções, como disse no post anterior, sobre tudo se tinha discutido quanto a possíveis efeitos secundários, menos sobre a possibilidade de estas ditas darem qualquer tipo de dor ou desconforto.

E chegado a quarta feira uma pequena dor fez-se sentir no fundo das costas, o que durante a tarde não passava de um ligeiro desconforto, iria se tornar um pequeno pesadelo pela noite dentro, ao ponto de me bloquear totalmente a zona da bacia, dai a famosa alusão ao andarilho preso as pernas, ora nem sentado, deitado, aninhado ou mesmo ao comprido, qualquer posição era uma mera forma de aliviar o desconforto por breves minutos.

E se quis dedicar um post a esta situação em exclusivo, é porque ela vai abranger muitas partes que acho essenciais falar.

As dúvidas e as incertezas: Ao longo deste processo elas vão ser mais do que muitas, por mais preparados que estejamos, elas sempre existirão, um bem-estar matinal não garante um dia sem problemas, tudo pode mudar de forma muito rápida, de hoje em diante devemos dar toda a atenção ao nosso corpo, e deixar que seja ele a definir o que podemos e devemos fazer, todo este processo será muito lento e bastante exigente a nível físico pelas razões óbvias, por isso desde cedo teremos que ter isso em atenção, ninguém poderá prever o dia de amanhã, nem a ciência nem a medicina, por isso estar preparado física e mentalmente é fundamental.

A auto-medicação e consulta de informação: Se a auto-medicação é por si só um hábito que nunca deveríamos ter, neste tipo de doenças e com este tipo de tratamentos, os cuidados devem ser redobrados, as contra-indicações são muitas, e queremos tudo menos coisas que podemos perfeitamente evitar.

A consulta de informação merece todo o cuidado, tal como insisto em relembrar que toda esta aventura sobre o meu processo pessoal serve de exemplo naquilo que foi e será a minha experiência pessoal, estes relatos da mesma não tencionam ser uma qualquer receita milagrosa para seja quem for e nem a internet o será disso vos garanto. Podemos encontrar informação que nos prepare para isto e aquilo e nada de mal tem nisso, desde que não deixemos que essa informação esteja acima daquela que podemos obter pelo pessoal medico, enfermeiros e mesmo auxiliares ao nosso dispor, e eles melhor que ninguém com todo o nosso histórico medico, saberão como nos tirar duvidas ou aconselhar.

Dito isto, quarta feira a noite e eu com um desconforto terrível e como nada se tinha mencionado sobre este possível efeito, um sem fim de dúvidas e receios invadiram-me, pois, porque eu também os tenho por mais positivo que eu possa ser e por mais que eu pudesse pensar estar preparado, e no momento o meu maior receio , era esse ser um qualquer efeito colateral da doença ou do tratamento, e o outro era, e agora o que faço? auto medicar-me estava fora de questão. Em suma não sabia sequer o que fazer para poder aliviar o desconforto e a dor.

Tempo para fazer alguma pesquisa básica, e por incrível que pareça nada acerca desse efeito que eu estava a sentir, nem um único apontamento, dai ligar para a linha Saúde 24, e de tão ridículo que foi, nem me vou dar ao trabalho de perder muito tempo com isso, a menina limitava se a perguntar se eu tinha febre e para tomar “ben uron” a ver se isso passava, e se não passasse para voltar a ligar.

Pois bem, serve isso para lembrar, que a febre é o nosso pior inimigo nesta batalha, e desde logo fui avisado, qualquer temperatura anormal, deveria de imediato dirigir-me a um hospital, o famoso “ben uron”, a minha médica pediu para evita-lo a todo o custo neste início de processo e pelo simples facto que a toma do mesmo poderia disfarçar uma febre que não sendo identificada o seu porquê poderia trazer graves problemas e/ou consequências, perceberam agora o ridículo da coisa?

Já estamos perto das três de manha de quinta feira e decidi mandar sms a um familiar meu, para que assim que acordasse me viesse buscar e levar a urgência do hospital de dia no porto, nos entretanto voltei as pesquisas e depois de muita e elaborada procura, lá encontrei uma tese sobre um problema idêntico ao meu, na qual havia uma conclusão sobre que tipo de medicamentos eram recomendados nestes casos, pois é, e o do topo da lista, estava ali na minha mesinha de cabeceira, irónico não é, fartei me de o tomar por causa do nervo axilar.

O único problema do mesmo, é que sendo de efeito prolongado, demora o seu tempo a fazer efeito, de qualquer forma segui para o hospital e la fui atendido na urgência

Ao expor o meu caso levei com dois sorrisos enormes e a frase que saiu da boca dos médicos foi, “mas isso é óptimo se teve essa reacção, é sinal que as injecções tiveram o efeito desejado” para de seguida dizerem “tomou a medicação de apoio certo (os tais comprimidos)?”

Ao que respondi “não, não sabia o que tomar”

Os sorrisos desapareceram e passou a caras bastante fechadas de espanto, e lá se percebeu o grande imbróglio que isto tinha sido, o comprimido era o tal da pesquisa, teria dado jeito saber disso antes, mas pronto, é porque tinha que ser assim, e sinceramente por mais mal que eu me sentisse naquele momento, com o ainda desconforto, foi um alívio saber naquele momento, que era algo normal, nessas longas horas muito me passou pela cabeça.

O resto, é eu a vir embora com um andar jeitoso, e uma cara de parvo todo feliz, o problema continuava a ser o mesmo, não havia novidades, e isso para mim, nesse momento, bastava para me deixar bastante feliz.

E sim, a terceira semana e as analises confirmaram isso, defesas recuperadas, tudo pronto para o segundo ciclo, uns dias de descanso e lá vamos para mais uma rodada.

Cenas dos próximos capítulos: “o lounge, os anjinhos e a sorte que temos”

Nota: isto de resumir não está a ser nada fácil, desculpem qualquer coisinha, que eu vou ver se me desculpo a mim próprio por me ter metido nesta alhada.